Em determinado momento de “Oito Mulheres e um Segredo”, a equipe de ladras liderada por Debbie Ocean (Sandra Bullock) se vê em uma situação complicada: as moças descobrem que o item que falsificarão possui uma fechadura de ímã, o que exige que elas refaçam a réplica. Esse poderia, então, se tornar um arco menor para a trama, criando urgência pela necessidade de uma rápida solução para o problema. A escolha do roteiro de Gary Ross e Olivia Milch, porém, é saltar, de uma cena para outra, para a solução: uma personagem nova surge única e simplesmente para resolver o problema e, então, desaparece sem dar as caras outra vez.
Essa cena, isoladamente, não prejudica tanto “Oito Mulheres e um Segredo”, mas é muito simbólica se analisarmos a obra de Gary Ross, que, além de escrever, dirige o filme. Assim como a trilogia de Steven Soderbergh, “Oito Mulheres” aposta demasiadamente no carisma de seu elenco para conquistar o espectador, mas se esquece de estabelecer, por trás do talento de estrelas como Cate Blanchett, Sandra Bullock e Anne Hathaway, um roteiro que dê alguma personalidade e arcos para essas personagens.
Não que os ladrões vividos por George Clooney, Brad Pitt, Matt Damon & Cia. fossem exemplos de profundidade, mas pelo menos o humor, presente em cada diálogo e trajetória dos golpes, tornava “Onze Homens e um Segredo” não somente um heist movie, mas também uma comédia. O filme de Ross é focado exclusivamente no golpe e na trajetória de Debbie Ocean – que, vale dizer, é pouquíssimo desenvolvida. Faltam não só piadas, mas cenas que desenvolvam os relacionamentos das mulheres a fim de aproximar tanto público e elenco, quanto as próprias ladras, que sempre parecem emocionalmente distantes uma da outra.
E, se o foco é no golpe, a problemática estrutura do roteiro impede que a obra trate o assalto como um evento dramaticamente eficiente. A execução do golpe sempre é entrecortada por novas explicações que trazem complexidade ao plano. O problema, porém, é a ausência absoluta de qualquer dificuldade que possa criar investimento emocional do público na missão. Tudo funciona de forma demasiadamente perfeita, e, como dito no primeiro parágrafo desta crítica, o mínimo sinal de perigo é resolvido praticamente no mesmo instante em que a obra apresenta o obstáculo.
Outro problema de “Oito Mulheres” é a herança maldita de seus antecessores masculinos: a necessidade de sempre trazer uma grande reviravolta que surpreenda o público. Em certo ponto do filme, um plot twist fica não só inevitável, como evidente – Gary Ross mostra ter a sutileza de um mamute. Até quando um personagem esbarra no outro, o trabalho excessivo dos elementos fílmicos – a câmera que se movimenta de forma a escancarar a anormalidade do acontecimento, o som que destaca o choque e a atuação dos atores – tornam óbvio que o momento “esconde” um sinal para uma virada narrativa.
Prejudica ainda mais o filme o fato de só haver um arco para a personagem principal, que é justamente a jornada que expõe a reviravolta final de “Oito Mulheres e um segredo”. Não há, portanto, surpresa, já que, desde os minutos iniciais, é fácil perceber o que virá nos cem minutos seguintes. Não há possibilidades, nuances ou alguma aspiração narrativa adjacente ao arco narrativo protagonista, o que torna a obra, além de previsível, simplória.
Sem nenhuma intenção narrativa que não seja ser uma nova e genérica versão da saga “Ocean’s”, “Oito Mulheres e um Segredo” subaproveita o elenco feminino extremamente talentoso em um filme pouco criativo, que não percebe o potencial desperdiçado. A partir do momento em que as reviravoltas dependem de muito boa vontade do público para acreditar nos acontecimentos – personagens decidem cometer atos que põem em risco suas carreiras e vidas pessoais sem nenhuma justificativa plausível -, a única alternativa da obra de Gary Ross seria satirizar o absurdo das soluções do longa.
Não acontece, e por ser um filme superficial no trato de seus personagens, morno em suas aspirações dramáticas e falho ao tentar ocultar suas surpresas, “Oito Mulheres” se torna uma obra dramaticamente estéril e com segredos que se revelam antes mesmo de sabermos que são segredos.