O ideal político de um filme nunca foi necessariamente um problema. Nem quando se fala do patriotismo míope do americano médio. Afinal, apesar de ser válido discordar das visões de Chris Kyle, o “herói” que protagoniza o excelente “Sniper Americano”, é difícil não reconhecer as qualidades narrativas da obra feita pelo veterano Clint Eastwood. Casos como “12 Heróis”, porém, são praticamente o oposto de “Sniper Americano”. Dirigido pelo estreante Nicolai Fuglsig, cineasta dinamarquês de 46 anos, o filme que origina esta crítica pouco traz como Cinema. É um longa pedestre e extremamente falho em suas pretensões. De “12 Heróis”, parece não haver muito o que tirar se não explosões confusas e mais um panfleto de patriotismo barato.
A trama adapta os eventos reais de um esquadrão de operações secretas do serviço militar americano. O grupo de 12 soldados liderados pelo capitão Mitch Nelson (Chris Hemsworth) é enviado para o Afeganistão em uma missão secreta logo após o atentado terrorista da Al-Qaeda realizado em 11 de setembro de 2001. Entre os outros militares, há personagens vividos por nomes conhecidos, como Michael Shannon, Michael Peña e Trevante Rhodes (o Chiron adulto em “Moonlight”). Chegando ao destino, Mitch e sua equipe devem trabalhar em parceria com Dostum, líder do grupo rebelde que quer tirar o Talibã do poder.
“12 Heróis” não perde tempo dando muito desenvolvimento aos seus personagens. Além da simplicidade, há uma incômoda falta de cuidado. Os únicos três a terem algum passado desenvolvido – Mitch (Hemsworth), Spencer (Shannon) e Diller (Peña) – possuem o exato mesmo contexto familiar: deixarão suas esposas e filhos para ir ao Afeganistão e, por isso, sentem-se culpados. A ideia do diretor é imprimir um peso patriótico na atitude do trio, que está pondo a pátria acima de suas próprias vidas. A velocidade com que os eventos ocorrem, porém, não permite que haja peso algum nas ideias do cineasta dinamarquês. Quando Hemsworth cogita esboçar uma feição de culpa, a câmera trêmula e a trilha o sufocam, e logo a narrativa salta para a ação.
A falta de impacto é um problema que persegue “12 Heróis” do começo ao fim. Nem quando estão no Afeganistão, os soldados parecem estar realmente expostos ou em perigo. Isso ocorre por três fatores: o primeiro é o fato de o roteiro nunca inserir o esquadrão em situações realmente perigosas, já que os americanos sempre estão protegidos pelos guerreiros de Dostum – esses, sim, morrem o tempo todo; o segundo é o total desinteresse em construir cenas mais introspectivas que explorem as psiques dos personagens, alternando sempre ação com diálogos expositivos; o terceiro é o fato de os vilões serem, na maior parte do tempo, figuras desconhecidas e distantes, que mais parecem alvos a serem explodidos do que inimigos a enfrentar. Se o objetivo da obra é estabelecer seus personagens como heróis, a total ausência de feitos heróicos e obstáculos a serem superados é fatal para o fracasso de “12 Heróis”.
Nada disso, porém, iguala o vergonhoso trabalho de câmera feito por Fuglsig e seu diretor de fotografia, Rasmus Videbæk (do excelente “Desajustados” em 2016, e no fraquíssimo “A Torre Negra”, em 2017). A dupla parece não fazer ideia de como construir uma simples cena de diálogo – a primeira conversa entre o protagonista e seus superiores no Afeganistão, por exemplo, usa mais de cinco variações de ângulos diferentes, o que imprime uma estilização que não só não faz sentido, como deixa a cena confusa e visualmente pesada. Nem os clássicos planos no contra-plongée que trazem personagens filmados na contraluz são utilizados. Não há, sequer, um plano ou enquadramento que tente criar um mito em torno dos soldados americanos.
Quando filma a equipe de Mitch reunida e discutindo suas ações, Fuglsig faz trabalho ainda pior, colocando sempre os personagens em círculo e alternando a todo momento os pontos de vista dos planos, o que impede não só que a cena tenha um eixo, como destrói toda a noção espacial do espectador, que sentirá uma mão pesada que faria inveja a Michael Bay. A mesma dinâmica acontece nas cenas de ação, que, em meio a tantas explosões, tiros e planos que buscam edificar os “heróis”, pouco fazem sentido e pouco impactam, já que a alternância de pontos de vista é tanta que torna difícil a compreensão do que se vê na tela.
Mas o real problema de “12 Heróis” vai além de sua ala técnica totalmente precária. O filme simplesmente não faz ideia de como edificar seus personagens. A título de exemplo, o líder rebelde Dostum, inicialmente, diz não saber falar inglês. O protagonista, então, tenta dialogar com ele em russo, até que o próprio Dostum começa a responder em inglês. A justificativa é… Que o afegão não confiava nos outros americanos que interagiram com ele, apenas em Mitch. O problema é: não há sequer uma cena que justifique a confiança conquistada pelo protagonista de Chris Hemsworth.
Os momentos mais edificantes – que são sempre mastigados pela trilha sonora – acabam acontecendo quando os bombardeios americanos têm efeito – o que pouco serve para dar alguma profundidade para aqueles personagens. O arco do protagonista também não é lá algo muito bem trabalhado: Mitch precisa, nas palavras de Dostum, deixar de ser um soldado e aprender a ser um guerreiro, ou seja, lutar com seu “coração”. Até mesmo esse clichê é subaproveitado, já que Mitch apenas passa a matar mais talibãs e agir com mais “sangue nos olhos” – ou melhor, “olhos de assassino”, como diz seu colega.
Fuglsig escolhe sempre o grandioso. As explosões, os planos aéreos que mapeiam o deserto afegão, as cavalgadas dos heróis – a ideia dos cavalos é uma clara tentativa de relacionar os militares da obra com os heróis do western -, mas esquece que o heroísmo não reside nas grandes ações, mas no desenvolvimento psicológico dos indivíduos. Não há reflexão, aprendizado ou algum questionamento sobre os contextos sociais e políticos do país que os americanos invadem, apenas um vazio e burro instinto de violência. Mitch e sua equipe estão lá apenas para metralhar e explodir.
“12 Heróis” é um filme que tem, em suas mãos, uma história com grande potencial. Não só para mostrar o choque cultural de guiar uma invasão em um país com contextos sociopolíticos totalmente diferentes, como também para ser um eficiente drama de guerra. O resultado, porém, é extremamente falho. “12 Heróis” é apressado, confuso e extremamente vazio. Mais parece uma desculpa para mostrar americanos fuzilando talibãs e bombas caindo dos céus. É pouco (ou quase nada).