É impossível negar o impacto cultural da franquia Pokémon nas últimas três décadas. De um par de jogos para Game Boy, os “monstros de bolso” se tornaram a segunda maior franquia de mídia do gênero no mundo, atrás apenas de “Mario Bros”. Tão impossível de negar é o fiasco da nova adaptação para o cinema “Pokémon: Detetive Pikachu”. Inspirado no jogo para Nintendo 3DS, o filme de Rob Letterman não tem história, estrutura, ritmo e nem mesmo coração.
Começando pela dupla de protagonistas. Tim Goodman (Justice Smith) é um jovem corretor de seguros que é informado da morte do pai, o policial Harry, e precisa ir a Ryme City recolher seus pertences pessoais. Tim não gosta de pokémon. Já Pikachu (dublado por Ryan Reynolds) é o parceiro de Harry e, sofrendo de amnésia, precisa da ajuda de Tim para descobrir o que aconteceu na noite em que supostamente os dois morreram (o fato de Pikachu estar vivo levanta a possibilidade de Harry também ter sobrevivido ao acidente).
A premissa em si não é ruim, Um garoto que não gosta de pokémon se vendo obrigado a trabalhar em equipe com um. Mas por que Tim não gosta de Pokémon? O filme falha em dar uma explicação satisfatória. Já o porquê do Pikachu falante – que apenas Tim consegue ouvir – causa uma incoerência do tamanho do Gyarados no porquê de apenas Tim conseguir ouvi-lo.
“Pokémon: Detetive Pikachu” não é apenas um filme incoerente, é também um filme burro. E o problema maior de ver um filme burro é que o espectador também se sente burro. O jogo de luzes na noite de Ryme City (quando Tim conhece Lucy, a jornalista da “CNM”, as lâmpadas externas alternam azul e vermelho, sugerindo que aquela relação será tão racional quanto passional) tenta dar um ar de film noir à obra e, no nível estético, é bem aplicado. Mas essa referência nunca mais é utilizada. Além disso, o filme não consegue estabelecer uma investigação que tenha o mínimo de mistério.
Mesmo escolhendo os caminhos mais óbvios desde o início, “Detetive Pikachu” consegue, por volta da metade do filme, entrar num beco sem saída. Mas sempre que a história trava, algo “miraculosamente” surge e fornece à dupla uma nova informação. A presença do Mewtwo é praticamente a de um “deus ex machina”, “resolvendo” os furos do roteiro com diálogos expositivos. Outro aspecto indigente no filme é a forma como os pokémon são subutilizados. O mundo não é diferente por sua causa. Seus poderes não são utilizados de forma inteligente para desenvolver a história. Eles apenas existem.
Fica o registro positivo dos efeitos digitais que trazem os monstrinhos para o mundo real. Mas “Pokémon: Detetive Pikachu” não tem absolutamente nada além disso para se orgulhar. Nem o sininho da nostalgia é tocado. É quase criminoso que atores do calibre de Ken Watanabe e Bill Nighy sejam colocados em situação tão constrangedora. Mas nem eles, nem Ryan Reynolds e nem mesmo a alma de Ash Ketchum seriam capazes de salvar um filme que trata o seu público tão mal.