Há um perigo tremendo em se encontrar sozinho com seus próprios sentimentos. Qualquer artista disposto a transformar isso em prosa ou imagem já tem pontos de boa-vontade de antemão, ao escancarar-se para o mundo com as piores impressões de si mesmo. O último de Lorde já anuncia na primeira faixa, The Path, um sentimento questionador, mesmo que conformista, do que pretende insinuar no decorrer do disco. Essa abertura declara o temor milionário que a fama adolescente a proporcionou e evoca os momentos que serviram de prelúdio a Solar Power, até anunciar a missão do álbum: perguntar, não guiar.
A jovem de Royals não fazia questão do ouro cantado pelos trovadores de seus anos formadores e essa sua nova versão precisa anunciar sua apatia à moeda mesmo após a ter acumulado. Mesmo que não pretenda guiar, Lorde se coloca em lugar de observação passiva enquanto caminha erráticamente em torno dos temas que Solar Power tem em mente. Suas perguntas soam menos como genuína curiosidade e mais como reafirmação de valores, uma prestação de contas que (talvez) ninguém esperava. Mesmo encontrando uma nova forma para suas frustrações, a admissão de culpa de Lorde, ainda que inerte, segue firme na exploração das forças inevitáveis da juventude que a neo-zelandesa sonda desde 2013.
Buscando demonstrar resistência ao impulso apático que assola o estado-de-tudo em sua lírica, o universo sônico tecido por Lorde e Jack Antonoff se esconde em sua própria humildade, escondendo refrãos pop em uma produção lânguida e tímida, que parecem temer uma maior ostentação sonora. Faz sentido, visto que Solar Power é, de certa maneira, um álbum de cura, de reencontro e, por bem ou mal, um reflexo autocentrado sobre males muito maiores que as ânsias rebeldes e amorosas da adolescência.
Ao mirar no que a cerca, Lorde encontra um mundo que não reconhece. Após anos de recolhimento em seus imbróglios juvenis, ela encontra de olhos esbugalhados a natureza, engolida por um planeta doente. O que Solar Power indica é não só um momento de processamento do passado, quanto do presente. É um retrato da mutação pela confusão: os instrumentais minimalistas dão passos à frente, ao mesmo passo que se recolhem; as letras permanecem com o mesmo grau de intimismo de sua fase romântica, enquanto tentam se descolar de uma responsabilidade autoimposta. A confusão de Lorde é rotineira e inevitável. Os aspectos desinteressados que afastam o ouvinte do álbum são os mesmos impulsos que trazem seus momentos mais vivos, da produção conservadora que se abre ao contemplativo, aos vocais simples que deslizam em melodias em contínua reorganização. A busca por refúgio se dá nos pequenos confortos, na procura por momentos de beleza, por mais equivocados e danosos que esses esforços possam acabar sendo.