Após o show de 4 de fevereiro na Genting Arena, em Birmingham, o Black Sabbath está oficialmente aposentado. Junto com a banda, termina um dos capítulos mais relevantes da história do rock. Se o linfoma de Tony Iommi pesou na decisão de encerrar as atividades, só podemos especular. O que fica para a posteridade são 19 álbuns de estúdio, lançados ao longo de praticamente 50 anos de carreira. Entre múltiplas formações, inventou e reinventou o Heavy Metal. 11 a cada 10 músicos do meio citarão a banda como referência, e não por acaso. Abaixo, 5 características marcantes do Black Sabbath, que mal se foi e já faz seus fãs se sentirem órfãos:
Qualquer biografia que se preze conta esta história. A propósito, é uma das poucas em que praticamente não há divergências sobre como aconteceu. Em meados de 1968, o Sabbath ensaiava em frente a um cinema. Em cartaz, o filme As Três Máscaras do Terror, dirigido por Mario Bava e estrelado por Boris Karloff. Da janela do estúdio, Ozzy Osbourne e o baixista Geezer Butler conversam: “as pessoas pagam pra levar sustos no cinema. Será que não pagariam para levar sustos ouvindo música?” E assim surgiu o heavy metal, um estilo de música com o diferencial competitivo de “assustar as pessoas”.
O nome do filme em inglês? Black Sabbath.
A Inglaterra foi, sem dúvida, o país dentre os Aliados que mais sofreu durante a Segunda Guerra Mundial. Hitler quase afundou a ilha com ataques aéreos massivos. Sempre que a Luftwaffe se aproximava para mais um bombardeio, sirenes tocavam para que a população se escondesse e rezasse. Em 1970, 25 anos após a Guerra, com a maioria das pessoas que viveram seu terror ainda vivas, o Sabbath lançou Paranoid, seu segundo disco. A faixa de abertura, “War Pigs”, contém um sample dessa sirene. Pense num veterano ligando seu rádio e ouvindo aquele som de novo.
No auge da Guerra do Vietnã, o Sabbath resgatou a pior lembrança possível para acertar um murro na boca do estômago dos tecnocratas belicistas.
Black Sabbath inaugurou o heavy metal, Master of Reality o doom metal e Sabotage, o thrash metal. As experimentações de Osbourne, Butler, do guitarrista Tony Iommi e do baterista Bill Ward influenciaram muita gente. Se você gosta de Iron Maiden, Judas Priest, Candlemass, Anathema, Slayer, Metallica E GRANDE ELENCO, agradeça a estes quatro senhores.
No total, 25 músicos já tocaram com o Black Sabbath em algum momento de sua história. Vinte e cinco. Uma das únicas bandas com duas formações clássicas (além de Iommi-Osbourne-Butler-Ward, é icônica a fase com Ronnie Dio nos vocais e Vinnie Appice na bateria), o Sabbath já acolheu lendas como Ian Gillan, Glen Hughes, Tony Martin e Cozy Powell. Mesmo quando tudo ia de mal a pior, encontrávamos dignidade em cada trabalho, além de um som característico do Sabbath.
O que nos leva ao último item desta lista,
Tony Iommi era soldador. No último dia de trabalho antes de começar uma turnê por Irlanda e Gales com sua primeira banda, os Rockin’ Chevrolets, lhe pediram que usasse uma prensa. Quis o destino que ele perdesse as pontas dos dedos médio e anular da mão direita (ele é canhoto) num acidente a horas de meter o pé na estrada. Em sua biografia, diz que até hoje tocar guitarra é um processo doloroso. Desenvolveu suas primeiras próteses sozinho, reaprendeu a tocar guitarra e aprimorou o instrumento (as cordas 0.008 existem graças a ele). Mesmo num turbilhão de drogas, processos judiciais e intrigas, nunca desistiu. Foi o único membro a fazer parte do Black Sabbath do princípio ao fim.
Um homem capaz de, já consagrado e sexagenário, fazer base para jovens guitarristas solarem.
O Black Sabbath é a prova de que a arte resgata vidas. Nenhum destes homens seria grande coisa no “mundo real”. Ozzy chegou a ser preso por roubar uma televisão quando jovem. Se você tem talento, é obstinado (e as circunstâncias te ajudam um pouquinho, é claro), é possível virar a mesa e construir um novo futuro. O mundo mudou naquele inverno de 1968, quando quatro meninos de cabelo comprido, comendo sanduíches de bacon feitos pela mãe de Ozzy (exceto Geezer, que sempre foi vegetariano), decidiram formar uma banda. O sentimento agora poderia ser de tristeza pelo adeus, mas é de gratidão.
Muito obrigado.
Forget all your sorrow
Don’t live in the past
And look to the future
‘Cause life goes too fast, you know…
“A Hard Road” (Never Say Die!, 1978)