Em 2009, Star Trek voltou aos cinemas depois de uma pequena pausa. Dirigido e co-produzido por J.J. Abrams, o “reboot” conseguiu dar vida nova à cultuada franquia de ficção científica e agradou não só os fãs mais antigos da série, como conquistou os mais jovens. Em 2013 o mesmo J.J. Abrams retornou para a franquia e fez Star Trek: Além da Escuridão, um filme tão bom quanto seu antecessor.
Em 2014, porém, a mente por trás da nova visão de Star Trek trocou a franquia por outra tão cultuada quanto: Star Wars. O substituto foi um nome questionável: Justin Lin, responsável por quatro filmes da pavorosa franquia Velozes & Furiosos. Mesmo com a permanência de J.J. Abrams na produção do filme,
a mudança de tom é clara. O novo Star Trek tem menos ficção científica e nostalgia, apostando mais na ação. O resultado, porém, não é ruim, apenas diferente. O filme funciona em tudo que se propõe e é um dos melhores filmes de ação/aventura de 2016.
O longa começa muito bem e tem em seu primeiro ato seu ápice. A Enterprise está no terceiro ano de uma missão de cinco. Os tripulantes da nave começam a mostrar desgaste físico e psicológico. Uma pesquisadora alienígena aparece pedindo ajuda, e Kirk (Chris Pine) e seus amigos logo encontram-se presos numa armadilha do vilão Krall (Idris Elba).
A ideia de mostrar o desgaste mental dos personagens era extremamente interessante, mas, como se espera de um blockbuster, acaba sendo sutilmente abafada. O foco do filme acaba sendo o conflito com Krall e o esforço da equipe para impedir a realização de seu plano.
Como era de se esperar, a direção de arte, os efeitos especiais e o som são impecáveis. Os cenários e figurinos são mais discretos que nos filmes anteriores, não só pela mudança da direção, mas também pelo fato do filme se passar praticamente inteiro em apenas um planeta, mas isso não afeta o trabalho, que capricha para construir raças e planetas vívidos e críveis.
O som é, provavelmente, a parte mais importante na construção da intensidade narrativa do filme. Em parceria com a trilha sonora, dá impacto às lutas e batalhas de naves, tornando o filme grandioso e empolgante. A direção, porém, não acompanha esta qualidade. Justin Lin não tem a mesma sutileza de J.J. Abrams e abusa de câmera na mão e de planos tremidos para disfarçar sua limitação ao retratar embates corpo a corpo.
O roteiro, apesar de recorrer a vários clichês de ação, é coerente e conduz corretamente a história. Por já ter praticamente todos os personagens estabelecidos nos dois filmes anteriores, não há tanta necessidade de desenvolver os tripulantes da Enterprise, mas o script de Simon Pegg e Doug Jung acertadamente dá mais camadas aos personagens, tornando-os mais humanos.
O que prejudica um pouco o longa é a montagem, que no primeiro ato esculpe perfeitamente o ritmo, mas acaba tornando o segundo um pouco irregular, com momentos sutis e outros um pouco exagerados. O clímax acaba sendo maior do que deveria. Não chega, porém, a ser um filme cansativo, mas claramente há espaços onde houve corte de cenas que poderiam desenvolver mais a história do vilão e traçar seu paralelo com a história de Kirk e que poderiam ser muito mais interessantes do que a ação frenética de Lin.
Outro grande acerto do filme é utilizar sutilmente homenagens ao recém-falecido Leonard Nimoy (o Spock da série clássica). As homenagens não só são emocionantes como são bem inseridas na história e possuem função narrativa. A relação da figura de Nimoy com a de Zachary Quinto (o novo Spock) ajudam a dar mais profundidade ao vulcano e resolve uma sub-trama importante do longa.
Star Trek: Sem Fronteiras é divertido, empolgante e mostra que há vida na franquia sem J.J. Abrams, pois mesmo que Justin Lin tenha suas limitações, faz um bom trabalho e torna a franquia mais abrangente. O resultado funciona não só em dar continuidade à nova geração de Star Trek, como é um dos melhores blockbusters do ano.