20º FESTCURTASBH – Mostra Cinema Negro: Família

20º FESTCURTASBH – Mostra Cinema Negro: Família

Yasmine Evaristo - 23 de agosto de 2018

A primeira sessão a que a equipe do Plano Aberto assistiu na Mostra Cinema Negro, que compôs o 20º FESTCURTASBH, foi a do programa “Família”. Os cinco títulos selecionados focalizam situações desenvolvidas no seio familiar. São eles: “Aquém das Nuvens” (2010), “O Som do Silêncio” (2017), “Deus” (2016), “O Dia de Jerusa” (2014) e “Quintal” (2015).

Os títulos abordam diferentes estruturas familiares e as relações entres seus membros, da solidão e memória ao abandono parental. Segue nossa opinião sobre cada um dos filmes.

Aquém das nuvens renata martins

Fonte: 20º FESTCURTASBH

Aquém das Nuvens (2010)

Direção: Renata Martins
São Paulo. 17 min

O curta inicia com a câmera acompanhando um senhor vestindo a sua beca de sambista, focalizando cada detalhe branco e azul de sua roupa. Em uma tarde de domingo, seu Nenê e dona Geralda, casados há 30 anos, conversam na cozinha de sua casa, antes de o senhor ir para seu sagrado samba. Em meio aos ritmos da música, seu Nenê pressente o pior. Em casa, recebe uma triste notícia sobre sua esposa. O homem encontra, então, uma maneira de se manter ao lado de sua amada, em sua estada no hospital.

A diretora fez duas escolhas que ressaltam o amor e carinho que envolve o casal. Primeiro, ao escolher apresentar o hospital como um lugar limpo, organizado, sem o caos habitual do sistema público de saúde, ela desloca os personagens negros do lugar comumente ocupado por eles, que é o ambiente da miséria.

Sua outra escolha são os closes nas mãos das personagens, afirmando sempre o zelo e o carinho que eles têm nutrido um pelo outro nesses anos de vida. Esse curta poderia facilmente não ter diálogo, e mesmo assim sua ambientação, iluminação e expressão – especificamente o olhar de seu Nenê – transmitiriam todas as informações necessárias para o acalento representado.

Assista ao curta aqui.

o som do silêncio David Aynan

Fonte: 20º FESTCURTASBH

O Som do Silêncio (2017)

Direção: David Aynan
Bahia. 17 min

Em uma casa mantida pela matriarca, pai e filho são desconhecidos, separados pelas distâncias físicas. Não existe comunicação entre eles. O garoto, Binho, observa seu pai, Osvaldo, no quintal pintando, sempre se esquivando do olhar e da presença dele. O homem pinta, repetitivamente, a mesma mulher. Esta, mais à frente, é revelada como sua ex-esposa.

A criança se sente só e curiosa sobre aquele homem que habita sua casa. O silêncio entre eles reverbera mais que os sons da casa, da rua ou da voz de sua mãe. Além do sumiço do pai – pelo que o texto nos informa, esse homem esteve distante por muito tempo -, há também a barreira da comunicação, pelo fato de ele ser surdo. A comunicação por Libras é feita com a mãe, mas não com o filho.

O filme situa a mulher mais velha como provedora e educadora da casa e dos que a habitam. Ao mostrar um breve diálogo com sua filha, estabelece-se que esta não pretende seguir esse caminho. A força que a matriarca representa é o elo entre Osvaldo e Binho. É ela quem ensina ao filho como criar um meio de se comunicar com seu neto, diminuindo o abismo entre eles.

Deus Vinícius Silva

Fonte: 20º FESTCURTASBH

Deus (2016)

Direção: Vinicius Silva
Rio Grande do Sul/São Paulo. 25 min

Mãe solo, períférica, trabalhando arduamente dia a dia para garantir o sustento da casa. O curta toca na grande ferida da sociedade, o abandono parental, ao mostrar a rotina de Roseli, mãe de Breno. Acompanhamos a dinâmica da semana dessa mulher na labuta e dor diária de ter que fazer várias escolhas para se ajustar. Seu filho estuda pela manhã e pela tarde e passa uma parte do dia na casa de uma tia para que a mãe possa se dedicar ao trabalho. O pai é apenas um nome em uma conversa com o filho, uma mensagem de WhatsApp ou uma voz ao telefone.

A reação dos espectadores ao fim da sessão, aplaudindo o filme, explica que mães como Roseli são mais comuns do que deveriam. Essas mulheres, chamadas de fortes, merecem que as olhemos não apenas como exemplo de superação, mas também como realidade a ser mudada. Ser forte, nesse caso, cansa. E muito.

O dia de Jerusa Viviane Ferreira

Fonte: 20º FESTCURTASBH

O Dia de Jerusa (2014)

Direção: Viviane Ferreira
São Paulo. 21 min

No subúrbio paulistano, em uma tarde comum, duas gerações de mulheres se encontram. São elas Jerusa e Sílvia. A senhora está aniversariando e aguarda a visita de seus familiares. A moça está trabalhando, coletando opiniões para uma pesquisa sobre sabão em pó. O curta de Viviane Ferreira permite que, por meio da tentativa de conversa entre as personagens, uma linha do tempo da vida das mulheres negras seja construída.

Cada uma possui, em seu tempo e em sua formação, os rastros da ancestralidade que as conecta.

Leia mais sobre “O Dia de Jerusa” aqui.

Quintal André Novais Oliveira

Fonte: 20º FESTCURTASBH

Quintal (2015)

Direção: André Novais Oliveira
Minas Gerais. 20 min

A rotina de um casal idoso de Belo Horizonte é alterada por uma situação, no mínimo, estranha. Com elementos do realismo fantástico, o curta “Quintal” usa do nonsense para construir a narrativa dos dois velhinhos simpáticos – interpretados pelos pais do diretor – em um dia rotineiro, no qual as alterações da normalidade são vistas como situações triviais.

Inserir em cena uma ventania semelhante ao furacão de que leva Dorothy para Oz e em seguida mostrar que o impacto provocado por isso é a roupa seca no varal, cria uma dicotomia entre o absurdo e o coerente. Da primeira à última cena assistimos a essa “brincadeira”, que trás leveza ao filme e, sem dúvidas, a sensação de diversão de maneira forte.

O curta pode ser associado a um episódio de “Arquivo-X” ou “Além da Imaginação”, com uma pitada de cafezinho e queijo minas.

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