Focado em estudar a maternidade sob dois pontos de vista diferentes, o drama japonês Mães de Verdade, de Naomi Kawase, tem como ideia construir um drama ao redor de duas mulheres emocionalmente quebradas. A primeira, uma mulher casada e estabelecida profissionalmente, perde o bebê durante a gravidez e vê na adoção uma chance de recomeçar. A outra, uma adolescente colegial, engravida por acidente e, sem saber o que fazer, acaba cedendo a criança para a adoção. Ambas se encontram já que a primeira adota o filho da segunda.
Kawase apresenta um drama de detalhes, sem se preocupar em grandes discussões e momentos intensos. Mães de Verdade está mais preocupado em encontrar a humanidade de sua história, em acompanhar o processo de aprendizado, amadurecimento e recuperação de duas mulheres feridas por suas relações com a maternidade. É uma história sem vilões, sem lados, que ao longo de seus 140 minutos, lentamente desconstrói qualquer indisposição que o espectador possa ter com suas personagens. Essa recusa pelos grandes momentos, porém, acaba fazendo com que Mães de Verdade muitas vezes soe como uma mera encenação de uma situação da vida real, sem que isso explore a história para além da pura estetização dos acontecimentos.
Para criar essa narrativa, Kawase utiliza um estilo bastante coerente com a ideia. Há poucos planos estáticos, Mães de Verdade é quase sempre filmado com uma câmera que flutua pelo cenário, que busca olhares e toques sem necessariamente enquadrar o que há de mais chamativo nas cenas. Essa câmera móvel combina bastante com o sentimento de incerteza e insegurança que permeia a trajetória das duas personagens, e permite que sintamos seus dilemas e nos relacionemos com a situação. Não por acaso, essa escolha de filmagem também dá à obra um tom naturalista, quase documental, já que rejeita uma variação maior de enquadramentos que são mais típicos do cinema narrativo contemporâneo.
Um elemento importante para fortalecer Mães de Verdade é a forma como Kawase faz uso os tabus sobre maternidade, sexualidade e família da sociedade japonesa para imprimir peso às jornadas das mães protagonistas. As poucas cenas das duas personagens principais lidando com seus problemas diante de suas famílias são importantes tanto para estabelecer um mundo que não lida com normalidade com suas questões, como também para aprofundar as diferenças entre as personagens. Enquanto a mãe que não pôde ter seu filho, por já ter uma família estabelecida, não tem grandes preocupações para além de sua infertilidade, a adolescente precisa lidar com toda a exposição e julgamento feitos por sua família.
Entretanto, mesmo assim, Mães de Verdade muitas vezes parece não ter muito para onde ir em termos dramáticos. A recusa ao drama e o desinteresse de Kawase por explorar com mais complexidade os dramas das personagens cobra seu preço, e em dado momento, os close-ups e planos fechados que humanizam e expõem a fragilidade daquelas personagens não funcionam mais. Mães de Verdade parece muitas vezes se sustentar apenas por sua estética, por seus planos de mãos entrelaçadas e folhas sendo balançadas pelo vento, imagens bonitas mas que, pela repetição, deixam de dizer alguma coisa e só parecem um capricho visual. É, portanto, um drama cheio de qualidades, mas que carece de lapidação e, principalmente, de objetividade.