Noite Perpétua

Noite Perpétua

Quando o espaço físico e o espiritual se encontram pela morte

Matheus Fiore - 12 de outubro de 2020

Noite Perpétua se passa durante a era do falangismo na Espanha, da década de 40, e mostra uma mulher que recebe a visita de oficiais que chegam para apreendê-la. Ciente de que, no cenário de guerra em que se encontra, não retornará para casa, ela aproveita os últimos momentos para se despedir de suas filhas. O curta do português Pedro Peralta poderia muito bem ter sua história contada em um formato mais longo – afinal, não são raros os casos de ótimos filmes que disseram eventos curtos ao longo de duas horas ou mais –, mas a escolha de contar essa história em apenas dezessete minutos é algo que, por si só, se prova essencial para que sintamos o quão fugaz e intenso é o momento vivido pelas personagens.

É evidente que o mote de Noite Perpétua é o quão breve é a despedida da protagonista de sua filha. É um filme que aproveita muito bem a atmosfera da guerra na Espanha para criar um cenário de desesperança. O espaço, predominantemente engolido pelas sombras, mostra apenas alguns poucos focos de luz nas paredes e é filmado em plano-sequência – mesmo que, evidentemente, haja um corte aqui e ali que Peralta não se esforça tanto para esconder. Uma das coisas que se destaca nesse espaço cinematográfico tão sombrio e calmo é o som, marcado apenas pelas vozes e pelo essencial uso do som diegético: um relógio que acompanha o curta até que a protagonista amamente sua filha pela última vez.

A marcação do tempo e todas as escolhas visuais que tornam o lar da protagonista um ambiente pesado e coercivo fazem com que Noite Perpétua pareça, ao mesmo tempo, uma despedida física e espiritual de sua protagonista. Ao passo que a mãe beija e amamenta suas filhas pela última vez, sabendo de seu destino, também temos a sensação de que, após seu último contato com o bebê, ela já está não só ciente da morte, mas morta de fato. O que Peralta constrói na casa é um espaço de sobrevivência isolado, dando a impressão de que além das portas da casa, só há morte.

A conclusão não poderia ser melhor para estabelecer essa mistura de espaço físico com espiritual. Enquanto a mãe deixa seu lar e sua vida para ir ao encontro da morte, o movimento da câmera que aproxima a lente das parede faz com que os pequenos pontos de luz do cenário se transformem em estrelas em uma noite. Estão definitivamente separadas a mãe e suas filhas, bem como a mulher e sua vida pregressa. Noite Perpétua é um retrato pontual e contido do sentimento de dor que precede o fim, tanto de relacionamentos quanto de sonhos e de liberdade. E o mero fato de Pedro Peralta optar por contar essa história em apenas dezessete minutos engrandece a obra por mostrar o quão fugaz é a janela de tempo entre a descoberta da condenação e o fim daquela vida. Não há tempo para discussões ou lamentos, apenas para despedida e fim.


Esse texto faz parte de nossa cobertura para a edição de 2020 do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba. Para ir até a página principal de nossa cobertura, clique aqui.
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