O ponto alto de “O Que te Faz Mais Forte” está em seu protagonista. Jake Gyllenhaal tem um comprometimento físico intenso para interpretar Jeff Bauman, vítima do atentado terrorista à Maratona de Boston de 2013. Mas não é pelo longo e doloroso processo de recuperação do corpo de Bauman que Gyllenhaal merece aplausos. Envolto neste sofrimento físico, Bauman se vê obrigado a rever conceitos de sua vida, com o ator imprimindo os sentimentos conflitantes em um trabalho que poderia ter recebido mais reconhecimento na temporada de premiações de janeiro.
Entre idas e vindas com sua namorada Erin (Tatiana Maslany), Jeff decide ir à Maratona de Boston para lhe dar apoio moral na reta de chegada. Essa decisão o leva ao centro do ataque, o que resulta na perda das suas duas pernas. Esse é um dos primeiros eventos do filme, mas o que acontece antes não é gratuito ou apressado. Em vez de uma ponte para o começo “de verdade”, o diretor David Gordon Green aproveita os primeiros minutos de “O Que te Faz Mais Forte” para criar um ambiente no filme, mostrar a rotina de Jeff, como ele se relaciona com as pessoas e a importância que ele dá a Erin. A quebra imediata dessa normalidade recém-estabelecida cria no espectador a mesma sensação de incompletude que no protagonista. É uma vida interrompida.
Os personagens são todos relacionados. Além da ex/atual Erin, têm destaque a mãe Patty (Miranda Richardson), o irmão Big D (Nate Richman) e o “Tio Bob” (Lenny Clark). Mas isso não os torna próximos. Precisamente por isso, é recorrente que sejam filmados atrás de grades, separados por portas ou mesmo isolados em close-ups. Green também opta por filmar os fundos dos quadros desfocados, isolando visualmente os personagens do primeiro plano, reforçando o isolamento emocional entre eles, principalmente de Jeff com os demais.
Após o acidente, a simples sobrevivência coloca o personagem vivido por Gyllenhaal no patamar de herói. Sua imagem é explorada pela imprensa. O povo o considera um símbolo do American Dream, que os terroristas não foram capazes de destruir com as bombas. Sua família começa a reforçar essa lenda, pois ela traz benefícios. O ponto explorado por “O Que te Faz Mais Forte” é que Jeff continua a mesma pessoa de antes, agora sem as pernas. O martírio não o purificou ou elevou seu espírito. E é desse conflito entre o que se espera dele e o que ele realmente sente que o filme se alimenta ao longo das suas duas horas.
Existe uma certa “barriga” (termo usado quando um filme tem um ou mais trechos mais longos do que o necessário) na metade final da obra, causada principalmente pela edição, que mantém cenas repetitivas em excesso, como encontros de Jeff com “fãs” ou discussões entre ele e as pessoas que o cercam. A estrutura convencional do roteiro, percorrendo uma trajetória clássica de queda, redenção e superação, também contribui para tornar esse “miolo” previsível e ligeiramente cansativo.
É aí que Jake Gyllenhaal faz de “O Que te Faz Mais Forte” o seu filme. Além da óbvia dificuldade de atuar “sem as pernas”, o ator – que já mostra talento desde “Donnie Darko” e de forma inexplicável pouco é citado como um dos melhores de sua geração – constrói uma personalidade serena, assertiva e compreensiva no primeiro ato, que vai degradando a cada desafio que a nova vida lhe impõe. Seu drama ganha credibilidade porque as mudanças nos rumos de Jeff estão calcadas em pistas que Gyllenhaal dá nas cenas anteriores.
Por mais que caia na esparrela da patriotada no desfecho, “O Que te Faz Mais Forte” funciona no que apresenta como o mais importante: estar vivo é o único pré-requisito para mudar.