Rosa Tirana

Rosa Tirana

Uma jornada fantástica mas um tanto quanto impessoal pelo sertão

Matheus Fiore - 26 de janeiro de 2021

Rosa Tirana tem uma proposta interessante: nos guiar por uma jornada pelo sertão do Brasil não se baseando nos estereótipos culturais comuns, mas transformando tudo em uma fantasia. Os encontros da pequena Rosa com as figuras excêntricas que vê pelo caminho são sempre recheados de misticismo e mitologia. O diretor Rogério Sagui faz dessa trajetória de Rosa uma excursão pela alma da região que é o berço cultural do Brasil – e que por isso, é mais rica e diversa do que qualquer outra do país.

A proposta é bastante interessante e Sagui encontra formas bem eficazes e lógicas para criar esse tom místico para toda a narrativa. As figuras amedrontadoras, sábias e protetoras se fazem presentes pelo caminho de Rosa. Há, por exemplo, um sábio cego digno de qualquer literatura infantojuvenil bem-sucedida que não só dá o tom do mundo que visitamos, como também mergulha a obra nesse tom fantástico. Não surpreende o espectador, portanto, que Sagui filme os galhos secos do agreste como quem filma as copas de árvores de uma floresta encantada de uma fantasia da Disney.

Fazendo de seu filme um carrossel de mitos e lendas, Sagui opta por fazer da própria Rosa uma figura um tanto quanto neutra. A personagem pouco fala e pouco age, é excessivamente reativa justamente para reiterar a ideia de que a protagonista é apenas um dispositivo com função única: guiar o espectador pelo universo fantástico de Rosa Tirana. É nessa escolha, porém, que a obra acaba encontrando seu maior problema: a impessoalidade. Por mais que o cosmo do filme seja sim interessante e inclusive muito bem filmado, a falta de peso nos acontecimentos que permeiam a jornada de Rosa acaba afastando dramaticamente a personagem do espectador. Quando Rosa se vê diante de uma ameaça, por exemplo, é difícil sentir qualquer apreensão, visto que nem mesmo a personagem esboça qualquer reação ou sentimento que fortaleça o tom de terror que Sagui busca imprimir na cena.

Sagui claramente sabe o que quer fazer, mas talvez não tenha aparado as pontas de forma que tudo funcione em harmonia. Se inicialmente a Rosa nos é apresentada como foco dramático, para além de uma mera guia do espectador pelo sertão, aos poucos ela simplesmente deixa de ter qualquer relevância e sua presença nos espaços passa a existir apenas para justificar vermos o que ela também vê. Falta, portanto, sentir a mínima aproximação da personagem com os espaços por onde transita. Falta percebermos como a jornada transforma a personagem, falta sentirmos que Rosa está de fato viva e percebe e sente tudo que permeia sua caminhada. O mundo está lá, muito bem construído para que o vejamos como fantástico o que é natural e que é mitológico, mas Rosa Tirana ainda carece do toque de humanidade que nos permite criar qualquer conexão emocional com esse lugar.


Esse texto faz parte de nossa cobertura para a 24ª Mostra de Tiradentes. Para ir até a página principal da cobertura, clique aqui
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