Em toda cultura há uma turma popular, conhecida por viver aventuras. Para nós, brasileiros, nos quadrinhos, essa turma é a da Mônica, criada por Maurício de Sousa no fim dos anos 1950. Inicialmente, as histórias contavam apenas com as personagens Franjinha e seu cão Bidu. As configurações que conhecemos agora se formaram a partir dos anos 1960. “Turma da Mônica – Laços” é a live-action baseada na graphic novel de Lu e Vitor Cafaggi.
O filme resgata o que Maurício de Souza sempre propôs em seus quadrinhos: narrar de maneira lúdica a infância de um grupo de amigos em sua vizinhança. As crianças do Bairro do Limoeiro se envolvem em uma aventura que inicia com o desaparecimento de Floquinho, o Lhasa Apso verde do garoto Cebolinha (Kevin Vechiatto). O menino, com suas cinco mechas de cabelo e sua língua presa – que o leva a falar “elado” -, se dedica a desenvolver planos infalíveis. Seu companheiro é Cascão (Gabriel Moreira), o melhor amigo, que tem medo de chuva e é o ponto cômico de toda trama, com suas desconfianças e respostas para tudo.
Os planos dos garotos consistem em tirar o poder da Mônica (Giulia Benite), a dona da rua. Ela sempre está acompanhada de seu coelho Sansão. Sua melhor amiga, Magali (Laura Rauseo), é uma garota que sempre se envolve em confusões por conta de seu enorme apetite. Quando o cãozinho do Cebolinha é levado pelo Homem do Saco (Ravel Cabral), essa rivalidade, que na verdade é apenas uma implicância, é colocada de lado, e a turma sai em busca de soluções para o problema.
As escolhas da locação, dos figurinos e fotografia foram capazes de evidenciar o que vemos nas páginas das HQs. Esses aspectos ficam bem claros nas roupas das crianças e nos lugares em que elas brincam. As cores são impactantes e reforçam a ideia da alegria de ser criança. Há liberdade expressa nesses aspectos. É a memória de Maurício de Sousa materializada de maneia verossímil.
E o bairro do Limoeiro está lá, transcrito da maneira que sempre o imaginamos. Um bairro de casas próximas, cercas baixas, pouco trânsito e pessoas caminhando despreocupadas. O céu é azul e o cachorro-quente do carrinho do Seu Juca parece delicioso. O romance de Titi e Aninha é de transformar nossos olhos em corações. “Turma da Mônica: Laços” está cheio de easter eggs que não escaparão dos olhos mais atentos. Há também a aparição de quatro pessoas importantes – como figurantes – ao longo do filme: o próprio Maurício; Sidney Gusman, coordenador editorial da Maurício de Sousa Produções (2006-); e os irmãos Lu e Vitor Caffagi.
Porém, de todos os coadjuvantes, temos que observar e elogiar o Louco, interpretado por Rodrigo Santoro. Com uma prótese nasal de dar inveja em Luciano Huck ele personifica de maneira perfeita o desajustado que nos quadrinhos persegue Cebolinha ao longo dos anos. E o encontro entre as personagens demarca um momento importante para o desenvolvimento do garotinho.
O roteiro adaptado por Thiago Dottori também manteve aspectos do que vemos nas HQs infantis. O filme mantém a pureza do olhar infantil. A graphic novel é mais “adulta” ao falar sobre amadurecimento, superação de medos, defeitos e barreiras existentes entre pessoas diferentes. Esses assuntos não deixam de ser abordados. As diferentes personalidades são evidenciadas, e as crianças são submetidas a “testes de resistência” em prol da boa relação coletiva. Eles precisam se entender e pensar/agir, para ajudar um ao outro.
A trilha sonora se assemelha à dos filmes em animação da turma. Há o uso de jumpscare como demarcação de alguma ação cômica ou de suspense. A canção “Laços”, composta por Tiago Iorc, é ideal para embalar memórias de infância. Ela combina com as práticas da Turma da Mônica: correr descalço na rua, subir em árvores e se divertir com os amigos, tudo o que a direção de Daniel Rezende tenta e consegue transmitir. O que prejudica a experiência é o ritmo: a narrativa demora para engatar e não leva o filme nunca a um ápice marcante, como aquele a que chegamos ao ler o quadrinho de origem ou algumas histórias do quadrinho tradicional.
“Turma da Mônica – Laços” é o filme para o início das férias escolares, proporcionando a crianças e adultos a opção de assistir a um bom filme nos cinemas. É uma viagem às memórias de infância de quem teve amigos com quem se divertir.