Na sequência da conversa com Caitlin Doughty (se você não leu a primeira parte, clique aqui), a autora de “Para toda a eternidade” falou da relação com os fãs e como aprender a lidar com a morte – e os mortos.
Mesmo a morte sendo um tabu no Ocidente, você tem quase um milhão de inscritos no YouTube e dois livros, um terceiro prestes a ser publicado. As pessoas não querem falar sobre morte, mas querem ouvir você falando. Por que, na sua opinião, temos igual pavor e fascínio pela morte?
Não acho que toda morte seja tratada como um tabu. Se você pensar a respeito, há muita morte presente no jornal da noite e no Twitter. Inúmeros filmes de terror e de zumbi estão em cartaz.
Certos tipos de morte são “ok”. O que nós não queremos falar é sobre morte natural! A ideia de que a nossa avó vai morrer. De que a sua mãe e o seu esposo vão morrer. Esse é o tipo de morte ao qual nós não temos muito acesso.
Eu nunca falei isso dessa forma, mas é verdade: eu tenho quase um milhão de pessoas me seguindo no YouTube! Mesmo que a gente não fale sobre a morte, por uma questão cultural, não é que as pessoas não queiram falar! Elas só têm medo de parecerem estranhas. Nós temos a ideia de que, se falarmos sobre a morte, vamos atraí-la, “convidá-la”. O que, obviamente, não é verdade!
Você vê algum avanço ao longo dos anos?
Eu acredito que nós estamos fazendo progresso. Eu acho que nós estamos estabelecendo um diálogo franco no Cinema sobre assuntos relacionados ao Terror na nossa cultura. A morte é apenas a última barreira a ser derrubada.
Vi no seu Instagram que você tem praticamente uma “fan base” por aqui, que criou a hashtag #ComeToBrazil e veio em grande número ver você em São Paulo. Qual a sua relação com fãs e qual o perfil médio deles? Você analisa algum tipo de “métrica” pra saber se eles são em maioria homens, mulheres, adolescentes, adultos, idosos etc.?
Pessoas que me seguem e leem meus livros têm um perfil bastante diverso, em gênero e em qualquer outra forma. Mas pessoas que aparecem em eventos e ficam numa fila por duas horas para terem seus livros autografados são, em maioria, jovens. Principalmente porque são eles que estão no Instagram e me trouxeram aqui etc.
Você fica surpresa por ter tantos fãs no Brasil?
Existe essa “cultura do fã” com a qual eu já estou familiarizada, mas ainda assim eles foram fantásticos no Brasil. Eu sempre tive muito apoio no Brasil e isso vem, eu acredito, porque Brasil e EUA são grandes países desenvolvidos com muitos problemas em comum: nós estamos jogando cultura pop, horror e ideias sobre a morte, mas não somos exatamente “autorizados” a falar sobre a realidade da morte. Eu acredito que eles (fãs brasileiros) estão buscando mais ou menos a mesma coisa que as pessoas nos EUA, que é uma conversa honesta sobre a morte.
Você escreveu três livros e tem um canal no YouTube onde fala bastante sobre isso. Mas se você tivesse esse momento para falar com uma pessoa que esteja lendo esta entrevista e nunca ouviu falar de você antes, qual seria o seu conselho para aceitar e lidar com a morte e os mortos?
Tire 30 segundos, um minuto, e pense como é a sua relação com a morte: quais os seus sentimentos sobre a morte, sobre a sua própria morte, a morte na cultura etc. Talvez seja algo que você nunca fez antes, ou nunca fez nestes termos. Esse é o começo da sua jornada. É totalmente compreensível não ter uma relação perfeita com a morte. Eu não tenho uma relação perfeita com a morte. E eu trabalho com isso há 11 anos! Pense sobre o que você faria para aprender mais e ser mais aberto. Ter uma relação aberta e positiva com a morte vai melhorar a sua vida. Muito da ansiedade e do medo que você sente estão conectados a esse medo da morte que todos temos. Ser mais honesto e aberto em relação a isso é bom. Há muita gente – como eu – disposta a ajudar. Bem-vindo à “Comunidade de Conscientização da Morte” (risos).