Plano Aberto

Nossos filmes favoritos de 2017

2018 está batendo na porta, mas não podemos sair de 2017 sem antes dizer quais foram os filmes favoritos da redação do Plano Aberto. Após choro, suor, lágrimas e alguns dedos na cara, trazemos a vocês o que mais nos agradou neste ano!

Para chegar a um consenso, os editores Matheus, Gustavo, Ana, Yasmine e Mario selecionaram dez filmes cada. O primeiro colocado recebeu 10 pontos, o segundo recebeu 9 e assim por diante. Os cinco filmes com mais pontos formam metade da lista; na outra metade, uma indicação pessoal de cada editor.

Fiquem agora com os vencedores do Prêmio Plano Aberto 2017!

Corpo e Alma (Teströl és lélekröl) Indicado por Yasmine

Abordar situações cotidianas de maneira criativa e questionadora torna o Cinema atraente. Unir essa abordagem a uma estética (visual) que emane beleza, mesmo ao retratar dores e/ou agressividade, é um prato cheio para se sentir atraído e compelido a pensar em um filme por dias. Em “Corpo e Alma” essa conexão foi feita, sendo ele um dos filmes mais belos deste ano.

A dualidade entre a realidade e o sonho compartilhado pelos protagonistas, mediada por silêncios e olhares, diz mais que os diálogos. Contém em si a atmosfera por vezes tão densa que pode ser tocada, e os gestos revelam o (des)conforto de cada um. Enyedi Ildiko conseguiu representar em seu filme as camadas existentes na solidão e a tentativa constante de eliminá-la, proporcionando ao público sensibilidade por meio da imersão.

 

De Canção em Canção (Song to Song) Indicado por Mario

Falando estritamente da Sétima Arte, são raras as obras que promovem reflexão, debate ou até mesmo oferecer espaço para a liberdade do espectador. Em De Canção em Canção, Terrence Malick faz o uso de sua famosa “câmera viva”, que torna-se muitas vezes invasiva quando se tratando do psicológico dos personagens e atores.

À medida que se investe no silêncio ou nos diálogos não prolongados, somos convidados a explorar o corporal, o sentimental e o não-palpável. As cores, a entrega das atuações em cenas que envolvem música e a associação de imagens metafóricas nos levam para um universo que parece ter sido esquecido, o da imersão. Somos constantemente estimulados por salas de cinema que tanto se propõem a nos fazer sentir no filme, que se esquecem de nos oferecer a sensação de ser o filme. De Canção em Canção nos faz lembrar.

 

Colossal                                                Indicado por Gustavo

Nacho Vigalondo flutua entre comédia, drama, ficção científica e fantasia para falar de alcoolismo, abuso e empoderamento feminino. Confuso à primeira vista, se torna exponencialmente mais poderoso e enfático a cada sequência. À medida em que imerge na trama de Gloria, uma mulher que precisa dominar o seu monstro interior para vencer o machismo, esta invenção humana que a oprime desde a infância, mais o espectador se afeiçoa e torce por ela.

Destaque para as atuações de Anne Hathaway, materialização icônica da mulher fragilizada e atordoada pelas obrigações sociais, e de Jason Sudeikis, preciso na composição do homem frustrado, que considera a ousadia e a autonomia de uma mulher ofensivos ao seu próprio fracasso, uma afronta que precisa ser contida e destruída antes que o mundo note a sua incapacidade de fazer o que realmente deseja.

 

Na Praia À Noite Sozinha (밤의 해변에서 혼자), Indicado por Matheus

O diretor Hong Sang-soo se tornou notório pelo realismo extremo exibido em suas obras. Ele busca, ao retratar a vida em suas passagens mais triviais e monótonas, extrair verdade de cada sílaba emitida por seus atores. Em Na Praia À Noite Sozinha, não é diferente.

O filme mostra como uma atriz enfrenta o término de um relacionamento em que fez grande investimento emocional. Paralelo ao “luto” pelo fim do namoro, a personagem lida com uma sociedade superficial que a julga apenas por sua aparência, oportunidade para Sang-soo trabalhar temas como a superficialidade e a liquidez do mundo moderno, utilizando uma metalinguagem que insere o espectador na narrativa e o faz sentir que também está oprimindo a jovem personagem. Tecnicamente perfeito e narrativamente ousado, Na Praia À Noite Sozinha, sem dúvida, é um dos filmes cujo diretor apresenta um invejável domínio do cinema e suas técnicas.

 

Columbus                                            Indicado por Ana Flávia

O brilhante diretor sul-coreano Kogonada nos presenteia, já em sua ficção de estreia, com uma pequena joia de poesia pura, sob a simplicidade de uma história de pessoas comuns, com problemas e angústias comuns. Todos os elementos do filme se articulam organicamente para contar como duas pessoas lidam juntas e ao mesmo tempo com situações-chave em suas vidas, a partir da imensa empatia que passam a sentir uma pela outra.

É claramente perceptível como as escolhas estéticas de Kogonada fazem parte da narrativa: a arquitetura da cidade, ligada intimamente à discussão temática que o filme propõe; a disposição dos personagens na tela, que nunca nos deixa esquecer a incompletude existencial que eles experimentam; e, sobretudo, a forma como o diretor os enquadra e os distribui em cada cena, para mostrar quão fundamental e espontâneo é o diálogo entre eles, e por que esse diálogo termina por ser definidor de suas decisões de vida.

 

Lady Macbeth                                                  5º lugar na votação dos editores

Grande filme do estreante em longas William Oldroyd, cujo resultado técnico e narrativo está muito acima da média anual. Sua maior qualidade é a de traduzir cinematograficamente a inquietante história da moça que se recusa a caber nos padrões de comportamento social e sexual definidos para as mulheres de classes abastadas na Inglaterra dos século dezenove. A escolha do diretor por uma perspectiva naturalista articulou com perfeição os cenários e ações dos personagens à ideia de evidenciar a repressão histórica ao desejo feminino, que é o tópico central do filme.

O suspense sufocante, o retrato da decadência moral no século XIX, a profundidade temática e o exímio técnico. Lady Macbeth é um respiro para o Cinema. Sutil e competente. Vale destaque também a atuação extraordinária de Florence Pugh, que será lembrada como uma das melhores do ano.

 

Como Nossos Pais                                          4º lugar na votação dos editores

Laís Bodanzky conta por meio de Rosa a história de todas as mulheres presas a uma sociedade patriarcal que vão, gradativamente, sufocando os próprios sonhos e objetivos pessoais para sustentar a chamada “família tradicional”. A jornada da protagonista, brilhantemente interpretada por Maria Ribeiro, é uma viagem introspectiva de autoconhecimento e emancipação. Um grito por liberdade.

A obra ainda ganha contornos filosóficos por sua capacidade de questionar a estrutura de sociedade patriarcal monogâmica que é imposta há séculos. Trazendo números temas interessantes e bem amarrados, Como Nossos Pais ainda é feliz por ser visualmente exuberante, utilizando uma fotografia que faz uso de rimas visuais, reflexos e imagens espelhadas para dizer ao público aquilo que seus personagens não encontram forças e meios para verbalizar.

 

Eu Não Sou Seu Negro (I Am Not Your Negro), 3º lugar na votação dos editores

A transferência para o audiovisual da pesquisa de James Baldwin sobre os levantes dos negros estadunidenses não resultou apenas num relato histórico ou didático. Atualmente, o que Raoul Pack consegue com o documentário é erguer a voz desse grande intelectual. Acompanhando a militância de três importantes nomes da população negra americana, seus anseios são a voz de alguém que volta para casa por perceber a necessidade da união em prol da sobrevivência.

Eu Não Sou Seu Negro define um norte: mostra-nos que a ninguém está reservada a prerrogativa de relatar as experiências e os sentimentos do que é ser uma pessoa vivendo massacrada em regimes estruturados pela discriminação. Ninguém tem o direito de falar pelo outro. Por isso, todo o filme é construído sobre a fala poderosa de James Baldwin, sua imagem e seu olhar, além de sua parresia exemplar para as gerações presentes e futuras.

 

Blade Runner 2049                                        2º lugar na votação dos editores

O maior mérito de Denis Villeneuve (como Rian Johnson em Star Wars: Os Últimos Jedi) foi se manter fiel à fórmula do filme original sem ficar refém dela. Mostrar ao público sua visão para o futuro da Terra imaginada por Ridley Scott, preservando a coerência com o filme original, mas sem copiá-lo. Oferecer algo tão novo para os olhos desta geração quando a obra de 1982 foi para aqueles que a viram no cinema.

Blade Runner 2049 é, assim como seu antecessor, tecnicamente perfeito, e como toda boa continuação deve fazer, respeita e expande todos os conceitos trazidos no cânone daquele universo. O resultado é uma obra que traz, em 2017, questionamentos sobre noções de memória e realidade que ainda engatinham para verem a luz do dia nos debates sócio-políticos da contemporaneidade. É, desde já, um filme vanguardista em relação ao seu tempo.

 

Ao Cair da Noite (It Comes At Night)      1º lugar na votação dos editores

Num mundo fictício onde uma doença similar à Peste Negra destruiu a civilização humana como a conhecemos, os sobreviventes vivem isolados, economizando recursos e incapazes de confiar nos outros. A obra utiliza tal cenário para traçar uma inteligente análise do comportamento humano diante de situações extremas, mostrando-nos como nossa organização social é frágil, e como um simples apagar das luzes pode nos fazer regredir diretamente à pré-história.

Se crises medianas nos fazem abrir mão facilmente das possibilidades de convívio com quem não pensa como nós, o que seremos capazes de fazer se a crise for muito grande, a ponto de ameaçar nossas vidas? Um grande filme é aquele que, em vez de entregar respostas prontas a essa importante questão, prefere apostar na perspicácia do espectador e lhe propor perguntas. Ao Cair da Noite faz isso com brilho e genialidade.

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