Plano Aberto

Os Defensores 1×01 – H de herói

Este texto é exclusivo sobre “H de herói”, primeiro episódio de Os Defensores, nova parceria Marvel/Netflix. Para ler a crítica da temporada completa, clique aqui.

É possível comparar a expectativa de Os Defensores com a de duas outras produções do gênero “super-heróis”: Os Vingadores é a mais direta por ser o primeiro “team up” do Universo Cinematográfico da Marvel. Mas não se pode ignorar Esquadrão Suicida. No fiasco da Warner/DC (leia nossa crítica aqui), os membros do grupo de operações especiais eram tão socialmente desajustados quanto os protagonistas de Os Defensores. E, apesar do resultado final decepcionante, as desventuras do Pistoleiro e seus blue caps estavam carregadas de hype antes do lançamento.

A própria Marvel decepcionou em Punho de Ferro. Cautela e canja de galinha nunca fizeram mal a ninguém.

Em que pese a crítica de um episódio isolado precisar ser comedida em relação a êxitos e sucessos, “H de herói” segue uma estrutura segura, razoavelmente equilibrada e com alguns elementos técnicos interessantes, caso eles sejam recorrentes no restante da temporada. Após Demolidor (duas temporadas), Jessica Jones, Luke CagePunho de Ferro (uma temporada cada) acontecerem isoladamente, é necessária uma ambientação antes que todos possam dividir tela. Mesmo com todos os cuidados nas produções anteriores, colocando personagens em mais de uma série, menções cruzadas etc.

Sigourney Weaver e Wai Ching Ho em “H de herói”, primeiro episódio de Os Defensores

Essa união precisa acontecer por um motivo à altura das habilidades combinadas do quarteto. E, ainda de forma insinuada, ela aparece. Alexandra, a personagem de Sigourney Weaver (AlienOs Caça-Fantasmas), se mostra uma antagonista tanto austera quanto temida. A Marvel consegue atrair atores renomados para seus projetos e isso faz toda a diferença. Um olhar de Weaver para Wai Ching Ho, intérprete de Madame Gao, passa mais informação sobre cada personagem do que linhas de diálogo saídas da boca de atrizes medianas. E, após cinco temporadas com antagonismo de Gao, uma pessoa que a domine representa perigo.

De forma até esperada, nenhum dos quatro protagonistas se vê como um herói. A maneira como o episódio avança nas histórias de cada um é razoavelmente equilibrada, com um pouco menos de tempo para Danny Rand (felizmente, porque Finn Jones é um ator muito limitado), possivelmente por Punho de Ferro ter sido lançada por último e a memória sobre sua jornada estar mais fresca. Uma observação é importante: mesmo que não se intitulem como “heróis”, cada um deles encontrou uma forma de continuar fazendo o que acredita ser o certo, exceto Jessica Jones. Um eco de sua experiência com o Kilgrave do excelente David Tennant e uma decisão perspicaz, pois seria incoerente com o tom de sua série solo que Jessica superasse rapidamente um abuso tão marcante.

O uso de câmeras “indiscretas” para os protagonistas de Os Defensores

Uma escolha notável do diretor SJ Clarkson é sempre mostrar os protagonistas de forma obstruída: pelo reflexo de um espelho, de outro cômodo, por trás de um banco ou de esguelha numa esquina. O espectador é colocado numa posição de voyeur, invadindo a privacidade destas pessoas que não querem o papel que está prestes a lhes ser promulgado.

Em consonância a isso, uma cena em que Matthew Murdock (Charlie Cox) é introduzido no mesmo cômodo da câmera é durante uma confissão: o momento que deveria ser íntimo é exposto de forma quase agressiva (logo em seguida, vemos o Demolidor por uma fresta do confessionário)

Os movimentos de câmera são, em geral, elaborados: durante uma conversa, Luke Cage sai do ângulo normal para um contra-plongée, que o deixa imediatamente maior e mais intimidador. Em mais de uma ocasião, o cenário onde Jessica Jones está é “varrido” por um movimento de 360° longitudinal, criando uma ilusão de plano contínuo, para que a personagem apareça em um lugar improvável em seguida. O ponto negativo vai exatamente para a cena de abertura, em que o Punho de Ferro entra numa luta claustrofóbica, de planos muito fechados, com movimentos de câmera irregulares e quebras recorrentes do eixo de 180°. Ainda não é em “H de herói” que vemos uma luta de Danny bem orquestrada.

Essa preocupação em manter a identidade visual que cada personagem trouxe de sua série é uma faca de dois gumes para Os Defensores. Demonstra capricho estético e temático, mas carrega para si o ônus da qualidade inferior de Punho de Ferro. O que torna o episódio melhor é seu pouco tempo de tela, algo que não poderá ser contornado na frente.

No âmbito da fotografia, os quatro heróis são divididos em duas duplas: Danny Rand e Jessica Jones, atormentados pelo passado, têm paletas mais frias; já Luke Cage e Matthew Murdock, saudosos pelos “velhos tempos” combatendo o crime, estão sempre associados a cores quentes

Três personagens inquestionavelmente bons e um que pode melhorar quando acompanhado por eles. Os Defensores é uma série tão boa quanto se esperava e a melhor escolha do fim de semana na Netflix. Assista à temporada completa aqui.

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